Thiago Barcellos
Bruno Ganz: Deus e diabo

Bruno Ganz encarnou de Deus ao diabo; de querubim apaixonado, em "Asas do Desejo", ao próprio belzebu, que vociferava impropérios à humanidade ao estrelar "A Queda - As Últimas Horas de Hitler".
Todos os seus personagens encarnados em tela são reais: românticos, cínicos, sutis, superficiais, finíssimos, profundos, e alguns não têm o menor caráter.
Como anjo, dirigido por Wim Wenders, lá está ele, acima de Berlim, observando a cidade e seus habitantes, pairando empoleirado sobre a divisão da cidade em zonas (já adivinhando, quem sabe, a unificação alemã que viria dois anos após o filme, em 1989).
Seu führer, para o filme de Oliver Hirschbiegel, era assim: um delirante que já não oferece perigo a ninguém, exceto a seus próximos, que sonha com grandes reviravoltas para uma guerra perdida.

Na Grécia, através das diretrizes de Theo Angelopoulos, filma "A Eternidade e um Dia", sobre um homem em confronto com o tempo inexorável e que usa um uniforme de inverno que parecia ser da marinha ateniense - casaco de fustão preto e gravata, com as golinhas viradas pra cima, e que parecia ser obrigatório o ano inteiro. No duro, um desbunde.
O suíço Bruno Ganz, esse ator que é todo dignidade e palavra musical - um esteta da arte de representar em oposição ao animal.
Tanto na paixão quanto na arte, aprendi que não se deve fazer amor à prestação. E a relação de Ganz com seu público é a de não ser somente um amante habilidoso, mas ser um dominador.