Thiago Barcellos
Oscar 2021: pandemia, sonho e ego
Atualizado: 20 de abr. de 2021

O Oscar é um prêmio que possui sua dose certa de vulgaridade, de idiossincrasia, de politicagem, de ego, e, finalmente, de arte.
E, apesar das crocodilagens, da pandemia e de todo o feitiço delicioso e inebriante do cinema, há de se atentar para o velho adágio que sempre chancelou a Academia, desde meados do século XX: o Oscar não é um prêmio justo. O Oscar é um prêmio honesto.
Mas e será que vale a pena ganhar o Oscar? Egos inflam feito balão de hélio? Qual é a emoção que se sente? Perguntas essas que até parecem óbvias, mas calma lá e vejamos.
Nos extras do DVD E.T. - O Extraterrestre (1982), o compositor John Williams, recordista de indicações à estatueta, responde a uma dessas perguntas de forma cândida e lúcida. Dizendo apenas: "Acho que é um traço humano, ninguém se cansa de ser valorizado".
Pedro Almodóvar, ao contrário, que sempre recusou remakes americanos de suas obras e em uma entrevista após seu Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1988) ter sido indicado ao prêmio de Filme Estrangeiro, foi taxativo: "Minha ambição sempre esteve nos filmes que faço, nas histórias que conto e não nos prêmios que recebo. Ganhar o Oscar te coloca num Olimpo difícil de assumir, isso se transforma em pressão na hora de trabalhar, e qualquer coisa que você faça será comparada à fita premiada".
Sidney Pollack, cineasta incontornável que sempre foi, por exemplo, sofreu uma espécie de processo inverso após ter sido laureado com o Oscar de Melhor Filme por Entre Dois Amores (1986). De certa maneira, consciente disso, ele tentou explicar o porquê: "Foi uma grande mudança na minha carreira. A primeira vez que fui indicado, meu filme teve oito indicações. Mas ganhar o Oscar não muda a vida de ninguém, bem, na verdade é uma maldição. Você gostaria de voltar à época em que ninguém prestava atenção em você. Alguns trabalhos, os de começo de carreira, eu estava feliz por estar dirigindo, não estava preocupado com as pressões". Agora, e sem mais quaisquer delongas, vamos a um pequeno compêndio crítico dos melhores filmes (na nossa nada modesta opinião) que concorrem ao Oscar de 2021, com cerimônia marcada para dia 25 de Abril.
Drunk, direção: Thomas Thomas Vinterberg (2020)

Professores quarentões e letárgicos rumo a um balé intoxicante à beira do precipício. Tragicomédia dinamarquesa que trata o álcool como parte fundamental da existência humana e que questiona se para sermos pessoas melhores necessitaríamos de aditivos. Ode da apreciação do agora - e que vale cada gota.
Meu Pai, direção: Florian Zeller (2020)

Pra uma turba, ser acometido pelo Alzheimer é como uma carta ruim que se tira no jogo da vida. Pra Tony Hopkins, gênio galês, não. Aqui, sua performance nos parece uma enciclopédia britânica sobre a natureza humana. Ator de fácil endosso ao panteão, eis um artista de expressividade e rigor estético inencontráveis em outras nações. Tony é o século do cinema.
Quo Vadis, Aida?, direção: Jasmila Žbanić (2020)

Longa da Bósnia-Herzegovina indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, é o registro do genocídio bósnio, reconhecido pelo Tribunal de Haia como o mais sangrento desde o final da Segunda Guerra Mundial.
Sob a ótica do assombro, um pesadelo lúcido dum episódio histórico, que assisti como querendo sentir dor como bálsamo para atenuar um coração fustigado.
O resultado é um exame doloroso de uma das facetas mais indigestas da história da humanidade. O Som do Silêncio, direção: Darius Marder (2019)

Baterista de uma banda de crossover metal se percebe acometido por surdez gradual e incurável. Nele, profano e sacro se manifestam; hora através de seus iguais, hora no simples soar de um carrilhão de igreja. E é na dura imersão da mudez monástica que Riz Ahmed, ator esse de olhos apocalípticos e graves, sugere todo um magnetismo bélico. Obra bonita e urgente sobre o triunfo do silêncio.
Minari, direção: Lee Isaac Chung (2020)

Minari , produção sul-coreana, papou o Globo de Ouro de filme estrangeiro e, assim como Druk é um dos favoritos para o Oscar de Filme Estrangeiro.
Se passa numa quinta do estado do Arkansas. Uma família de imigrantes, sob um mundo de silêncios absolutos, ante o sonho coreano e as raízes que germinam em solo forasteiro.
E a perspectiva, sempre, do fracasso: do não ser aquilo que pensamos e sonhamos que éramos. Dos estranjas, o mais terno, de longe.
Nomadland, direção: Chloé Zhao (2020)

Frances Mcdormand em Nomadland é atriz de impossível adjetivação. Se a entende melhor entrando na sua "música", deixando-se levar pela correnteza de associações. Ela nos leva a outras paragens, outros raciocínios. E, quando voltamos ao filme, pra valer, tudo é diferente, como imagens gravadas no vento. Mas a tal "música" ficou lá. E é formidável.